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Forum de Estudantes de Biologia da Universidade do Porto


    Gestão Conservação Biodiversidade Florestas Mediterranicas 2

    Varicela
    Varicela

    Número de Mensagens : 853
    03062009

    Gestão Conservação Biodiversidade Florestas Mediterranicas 2 Empty Gestão Conservação Biodiversidade Florestas Mediterranicas 2

    Mensagem por Varicela

    http://naturlink.sapo.pt/article.aspx?menuid=3&cid=4784&bl=1&viewall=true#Go_1 com fotos e graficos

    PARTE 2

    Figura 1.(ver graficos) Curvas de recuperação da vegetação após limpeza mecânica do subcoberto obtidas através de modelos aditivos generalizados. As áreas a sombreado representam os respectivos intervalos de confiança de 95%. No canto superior esquerdo de cada gráfico são dados o número de graus de liberdade efectivos, a % de variância explicada e o valor de probabilidade (*** P <0.001) associados a cada modelo.
    Cogumelos
    Os cogumelos são as estruturas reprodutivas (esporocarpos) de fungos que constituem elementos fundamentais na manutenção da vitalidade e saúde dos ecossistemas florestais. As espécies micorrízicas protegem as árvores de ataques patogénicos e ajudam-nas a obter água e nutrientes, enquanto as espécies sapróbias fomentam a degradação da matéria orgânica participando activamente no ciclo do carbono. Na Serra do Caldeirão existe uma riqueza micológica muito interessante, com a presença de diversas espécies ao longo do ano. Foram inventariadas na Serra 130 espécies diferentes, às quais se devem juntar pelo menos 31 espécies ainda não identificadas devido à complexidade taxonómica dos grupos respectivos. Estas espécies representam 34 géneros, na sua maioria ectomicorrízicos mas também incluindo alguns sapróbios, como por exemplo os agáricos. Na serra os cogumelos detectados com maior frequência são os cortinários, especialmente o cortinário-vulgar, e os lactários.

    As espécies de cogumelos têm um padrão de ocorrência anual muito característico, o qual é determinado em grande medida pelo regime de pluviosidade e temperatura. A limpeza do subcoberto parece provocar uma forte perturbação nas comunidades de cogumelos, havendo contudo no caso dos ectomicorrízicos uma recuperação relativamente rápida (10 anos), provavelmente devido à manutenção de refúgios nas raízes das espécies arbóreas que não são afectadas pelas intervenções (sobreiro e, por vezes, medronheiro). O efeito parece ser mais forte e a recuperação mais lenta no caso dos sapróbios (30-40 anos), provavelmente devido à forte redução da camada orgânica do solo. Tanto nos ectomicorrízicos como nos sapróbios, o número de carpóforos parece reduzir-se a partir dos 40 anos, possivelmente devido aos efeitos do maior ensombramento e à eventual modificação das características da folhada. Desconhece-se contudo se esta menor abundância terá uma correspondência na redução da diversidade de espécies de cogumelos ao nível do solo, ou se se trata apenas de uma diminuição da frutificação. De qualquer das formas, verificou-se que nas parcelas onde as intervenções foram efectuadas há mais tempo frutificam taxa que não foram encontrados em parcelas intervencionadas mais recentemente, o que significa que estas parcelas poderão representar elementos essenciais para a conservação da biodiversidade de cogumelos à escala da paisagem.
    Borboletas
    As borboletas desempenham um papel importante nos ecossistemas terrestres, não só por serem elementos vitais na cadeia trófica, mas também por darem um inestimável contributo para a polinização das plantas. Como têm vida curta, e portanto muitas gerações em pouco tempo, permitem a rápida acumulação de informações taxonómicas, ecológicas e evolutivas, tornando estes insectos ideais para o estudo da dinâmica de populações. Certas espécies dependem exclusivamente de uma planta, tornando-as muito sensíveis às alterações do meio, sendo por isso consideradas indicadoras da qualidade ambiental e da integridade das paisagens naturais. Este facto faz com que os estudos de monitorização dos lepidópteros numa determinada área sejam muitas vezes utilizados como ferramentas indispensáveis na biologia da conservação. Na Serra do Caldeirão foram inventariadas 43 espécies de borboletas diurnas.
    A abundância de borboletas varia muito ao longo do ano, sendo normalmente mais abundantes no final da Primavera e início do Verão. Durante a Primavera a comunidade de borboletas é dominada pelas espécies, Gonepteryx cleopatra, Gonepteryx rhamni, Lasiomata megera, Melanargia ines, Papilio machaon, Euphydryas aurinia, Thymelicus acteon e Thymelicus sylvestris; enquanto no Verão, encontram-se apenas espécies características, são elas Charaxes jasius, Hyparchia statilinus e Hyparchia fidia. A composição e estrutura das comunidades de borboletas são também muito influenciadas pela gestão da vegetação do subcoberto. As parcelas onde a limpeza do subcoberto é recente possuem uma elevada abundância e riqueza de borboletas. Esta associação parece resultar do aparecimento de um elevado número de herbáceas em flor nas parcelas recentemente limpas. No entanto, algumas espécies surgem associadas a sobreirais bem estruturados surgindo apenas em parcelas onde as limpezas do subcoberto ocorreram há mais tempo como sejam Coenonympha pamphilus, Colias croceus, Iphiclides feisthamelii e Hipparchia fidia.
    Aves
    As aves são óptimos indicadores da qualidade ambiental sendo portanto úteis para compreender o efeito da aplicação de medidas de gestão na biodiversidade. Por um lado, desempenham um importante papel ecológico nos ecossistemas florestais mediterrânicos, nomeadamente como dispersores de sementes durante o Inverno. Nesta época a maioria das árvores e arbustos de fruto carnudo entram em frutificação proporcionando um aumento de alimento as aves que fazem deste um dos principais recursos alimentares. Por outro lado, devido à sua elevada abundância, as aves constituem importantes elementos na cadeia trófica dos ecossistemas florestais, não só como predadores mas também, como presas.
    A avifauna da Serra do Caldeirão é bastante diversificada, com uma composição específica típica de florestas mediterrânicas, com um total de 46 espécies de aves, das quais 40 na Primavera e 32 no Inverno associadas às parcelas amostradas. A comunidade nidificante é dominada por espécies associadas aos estratos arbóreo e arbustivo, e que se alimentam maioritariamente por invertebrados, como o chapim-azul (Cyanistes caeruleus), o melro (Turdus merula), o chapim-de-crista (Lophophanes cristatus), o tentilhão (Fringilla coelebs), o pisco-de-peito-ruivo (Erithacus rubecula), a toutinegra-de-cabeça-preta (Sylvia melanocephala) e a trepadeira-azul (Sitta europaea). No Inverno a comunidade é também dominada por espécies associadas aos estratos arbóreo e arbustivos predominantemente frugívoras, como sejam, o pisco-de-peito-ruivo, o tentilhão, o melro e o chapim-azul.
    As limpezas mecânicas do subcoberto têm efeitos duradouros sobre as comunidades de aves das florestas mediterrânicas, causando reduções acentuadas na sua riqueza específica e abundância. Após perturbação a abundância e riqueza de aves parece aumentar lentamente ao longo dos anos, atingido valores máximos apenas ao final de várias décadas (> 40 anos). Nas parcelas recentemente limpas as aves tipicamente florestais apresentam valores de abundância mais reduzidos; nestas condições, apenas as espécies associadas a florestas mais abertas como o chamariz (Serinus serinus), o pintarroxo (Cardulelis cannabina), ou o tentilhão, parecem ser favorecidas, o que se reflectiu num incremento da abundância nas parcelas onde o subcoberto foi limpo mais recentemente ou frequentemente. Outras espécies porém surgiram associadas a níveis de perturbação intermédios, como foram os casos da ferreirinha (Prunella modularis), da carriça (Troglodytes troglodytes) e do chapim-de-crista. Por fim, foi apenas nas parcelas onde o subcoberto é mais antigo (> 40 anos) que a maioria das espécies mais comuns na área de estudo apresentou valores mais elevados de abundância, nomeadamente, o melro, o pisco-de-peito-ruivo, a toutinegra-de-cabeça-preta, a toutinegra-de-barrete-preto (Sylvia atricapilla), o tordo-musical (Turdus philomelos), o gaio (Garrulus glandarius) e o chapim-rabilongo (Aegithalos caudatus).

    O estudo revelou ainda algumas diferenças sazonais em termos das respostas das aves à perturbação, tendo sido verificados efeitos mais relevantes nas comunidades de aves invernantes do que nas nidificantes. Estes padrões parecem reflectir, em larga medida, um aumento da capacidade de suporte para as aves nas parcelas com subcoberto mais antigo durante o Inverno (altura da frutificação), sugerindo a ocorrência de um processo conhecido por “fruit tracking”, o qual é utilizado para descrever as movimentações das aves para áreas onde a disponibilidade de frutos é superior. A diferença de intensidade das respostas à perturbação do pisco-de-peito-ruivo, da toutinegra-de-barrete-preto e do tordo-musical, entre as amostragens realizadas em Dezembro e Janeiro, as quais foram acompanhadas por diferenças muito importantes na disponibilidade de frutos devido à queda do medronho, parece reflectir o fenómeno descrito. A cobertura e a diversidade de espécies produtoras de frutos carnudos, como é o caso do medronheiro, são superiores nas parcelas há muito tempo sem perturbação. Neste contexto, estas áreas constituem importantes locais de alimentação para as aves durante o Inverno, que as seleccionam em detrimento de outras. O aumento da capacidade de suporte em Dezembro das parcelas com subcoberto mas antigo, onde a disponibilidade de medronho era muito alta (Figura 1), terá conduzido a uma concentração das aves nestes locais, as quais se terão dispersado após a queda do fruto, justificando assim a redução das respostas das aves à limpeza do subcoberto em Janeiro.
    Considerações Finais
    O regime de desmatação e a idade dos matos têm uma forte influência na biodiversidade dos ecossistemas florestais. Com a redução da periodicidade da limpeza e o envelhecimento do subcoberto aumenta o número de espécies arbustivas, atingindo valores máximos em matagais muito desenvolvidos com mais de 50 anos. Muitas espécies herbáceas perenes também estão mais representadas nas parcelas menos intervencionadas, enquanto que as herbáceas anuais respondem negativamente ao desenvolvimento do mato. Em geral, as espécies florísticas mais raras e ameaçadas declinam em regimes de perturbação muito intensos, havendo contudo outras espécies pioneiras que também são raras e ameaçadas. No caso das aves, tal como nas plantas lenhosas, o número de espécies e a abundância aumentam com a idade do subcoberto, devido à crescente complexidade estrutural dos povoamentos. Este efeito é muito marcado nas aves invernantes, devido à elevada disponibilidade de bagas e frutos nos medronhais e outros matagais desenvolvidos. Em contraste, muitas borboletas beneficiam da presença de áreas soalheiras com matos baixos e esparsos, sendo portanto favorecidas pelas desmatações. Os cogumelos têm um comportamento intermédio, encontrando-se as maiores abundâncias de espécies ectomicorrízicas e sapróbias em matos de idade intermédia (20-30 anos). Na generalidade dos grupos estudados existem espécies ecléticas, surgindo desde áreas limpas há um ano até parcelas com mato não intervencionado há mais de 50 anos. Independentemente destas respostas globais, contudo, verifica-se a presença de espécies de plantas, cogumelos, borboletas e aves características de povoamentos periodicamente desmatados, enquanto outras só ocorrem em sobreirais que não foram intervencionados nas últimas décadas. Existe portanto uma complementaridade na distribuição das espécies em parcelas com diferentes idades do mato e regimes de desmatação.
    Neste contexto, parece ser essencial manter um sistema em mosaico, onde diferentes níveis de gestão são aplicados, incluindo áreas onde a gestão do subcoberto seja completamente ausente durante várias décadas, permitindo assim a manutenção da actual biodiversidade da paisagem nestas áreas e para reduzir a incidência de incêndios. Não obstante, as prioridades de conservação, devem compreender a necessidade de protecção das áreas florestais onde o subcoberto esteja em estádios de recuperação mais avançados. Esta necessidade justifica-se não só pelos elevados níveis de biodiversidade comportados por estes locais e os longos períodos de recuperação dessa mesma biodiversidade após perturbação por limpeza mecânica do subcoberto, mas também pela raridade destas florestas que reduzem cada vez mais a sua área de ocupação devido aos incêndios mas também às limpezas do subcoberto e pela sua importância ecológica internacionalmente reconhecida (classificadas como Sítios de Importância Comunitária no âmbito da Directiva 92/43/EEC). A manutenção destas parcelas ainda que fragmentadas numa paisagem que outrora dominaram, podendo conter espécies raras ou ausentes noutros locais, conduz à preservação de reservatórios e fontes de biodiversidade, essenciais para garantir a recuperação das parcelas perturbadas devido à gestão do subcoberto.
    Propõe-se assim que os planos de gestão regionais destes ecossistemas deverão ser baseados na implementação de práticas florestais sustentáveis numa óptica de usos-múltiplos da floresta, que contemple a conservação da biodiversidade de forma compatível com a obtenção sustentável de contrapartidas sócio-económicas. Deverá ser realizada a promoção de actividades sócio-económicas locais, baseadas na exploração da cortiça e de outros produtos secundários como é o caso do medronho e do mel, o que permitirá a reversão da tendência de êxodo rural e assim, a homogeneização da paisagem bem como o aumento do risco de incêndios.
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      Data/hora atual: Qui 16 maio 2024, 04:40